(Jose Petitinga)
São decorridos trinta anos.
Circundados de bênçãos e aureolados de glórias, tinhas tu, já algum tempo, volvido no Espaço, afim de dares conta da árdua missão que foras investido pelo Cristo, quando eu, que te não conhecia ainda, achei-me um dia, vacilante e trôpego, numa azinhaga tortuosa e escura, estranhos aos esplendores da Natureza, sem prever onde terminara a escabrosa senda.
Aguçados espinhos rasgavam-me as plantas e as vestes, enquanto me fustigava o corpo mórbido a ventania rápida, ameaçando apagar a lâmpada bendita que Minha-Mãe me acendera n’alma para acelerar os meandros da tenebrosa jornada.
Eu chorava e blasfemava às vezes.
Sentia fome e sede… fome de saber e sede de Amor. Mas os raros frutos que pendiam de ramos enfezados eram venenosos e amargos, como amarga era a linfa estagnada que no caminho havia.
Pensei em retroceder; mas a Infância, de onde eu partira, estava tão distante…
Onde me achava eu?
Na Mocidade.
Mocidade?
Essa fase da vida para mim não teve atrativos. Lembro-me dela sem saudade. As flores cândidas de uma crença ingênua que me perfumara a adolescência, o sopro das tumultuosas paixões tinha varrido o meu caminho…
Era angustiosa a minha situação.
A dúvida, precursora da descrença e do desânimo, abeirava-se de mim, crocitando, como um abutre faminto.
Idéias confusas me assaltavam.
Gemidos e imprecações chegavam-me aos ouvidos, misturados com gargalhadas sardônicas e palavras cínicas, cheias de um ateísmo revoltante.
Quase à minha frente numa curva do caminho, vi subitamente desenhar-se um precipício hiante, que mudamente me convidava ao repouso, e que, para a minha imaginação doentia, tinha a forma de um grande zero.
Que seria aquilo: delírio ou sonho? O vestíbulo da loucura ou o Calvário da razão?
Ah! Era talvez o conluio de todas as faltas por mim cometidas nas encarnações passadas, apresentando o meu tribunal que desconhecia o seu libelo acusatório!
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Um abraço forte me deteve e uma voz segredou-me: “Lê”, enquanto mão amiga apresentava-me “O Livro dos Espíritos”.
Li e fiz que os outros o lessem.
A azinhaga continua a ser tortuosa e cheia de espinhos, mas é menos escura; e aos esplendores da criação já não sou indiferente com outrora.
Para curar as feridas dos acúleos tenho o bálsamo da Resignação. A nortada impetuosa me fustiga, às vezes, mas da Paciência os brandos zéfiros também me acariciam.
A Fé que Minha-Mãe me acendera n’alma é hoje mais intensa, tem o raciocínio por esteio.
Ainda choro; mas não blasfemo nunca.
A sede e a fome que me torturavam, diminuem à proporção que recebo os clarões do Evangelho.
Creio, espero e amo.
E é a ti, ó grande Mestre, que isto devo. A tua esmola de luz me redimiu.
A doutrina do Maior dos Mestres, que tu, seu enviado, espalhas por todo o planeta, regenerá-lo-á em breve, fazendo desta penitenciaria lobrega a morada dos manos, conforme a promessa contida no Sermão da Montanha.
Ave, Mestre!
Recebe nestas palavras o agradecimento de uma alma que salvaste.
(Transcrito de REFORMADOR de outubro de 1917, Pags. 312-313, nº 19) ou
(Transcrito de REFORMADOR de outubro de 1949, p. 240, nº 10).
Reverenciando Kardec
(Emmanuel)
Antes de Kardec, embora não nos faltasse a crença em Jesus, vivíamos na Terra atribulados por flagelos da mente, quais os que expomos:
- O combate recíproco e incessante entre os discípulos do Evangelho;
- O cárcere das interpretações literais;
- O espírito de seita;
- A intransigência delituosa;
- A obsessão sem remédio;
- O anátema nas áreas da filosofia e da ciência;
- O cativeiro aos rituais;
- A dependência quase absoluta dos templos de pedra para as tarefas da edificação íntima;
- A preocupação de hegemonia religiosa;
- A tirania do medo, ante as sombrias perspectivas do além-túmulo;
- O pavor da morte, por suposto fim da vida.
Depois de Kardec, porém, com a fé raciocinada nos ensinamentos de Jesus, o mundo encontra no Espiritismo Evangélico benefícios incalculáveis, como sejam:
- A libertação das consciências;
- A luz para o caminho espiritual;
- A dignificação do serviço ao próximo;
- O discernimento;
- O livre acesso ao estudo da lei de causa e efeito, com a reencarnação explicando as origens do sofrimento e as desigualdades sociais;
- O esclarecimento da mediunidade e a cura dos processos obsessivos;
- A certeza da vida após a morte;
- O intercâmbio com os entes queridos domiciliados no Além;
- A seara da esperança;
- O clima da verdadeira compreensão humana;
- O lar da fraternidade entre todas as criaturas;
- A escola do Conhecimento Superior, desvendando as trilhas da evolução e a multiplicidade das “moradas” nos domínios do Universo.
*
Jesus – o amor.
Kardec – o raciocínio.
Jesus – o Mestre.
Kardec – o Apóstolo.
*
Seguir o Cristo de Deus, com a luz que Allan Kardec acende em nossos corações, é a norma renovadora que nos fará alcançar a sublimação do próprio espírito, em louvor da Vida Maior.
(XAVIER, Francisco Cândido. Livro: Doutrina de Luz. Pelo Espírito de Emmanuel).